Todas as regiões do mundo tem suas lendas, seus personagens pitorescos e inventivos. Na zona sul do Rio Grande do Sul, o agropecuarista J...
Todas as regiões do mundo tem suas
lendas, seus personagens pitorescos e inventivos. Na zona sul do Rio
Grande do Sul, o agropecuarista Joaquim Francisco de Assis Brasil (1857
– 1938) encravou sua morada e de lá comandou alguns eventos importantes
para as histórias gaúcha e brasileira. Esta morada era nada menos do
que um castelo em estilo medieval, com cinco andares, 44 cômodos e 12
lareiras, erigido numa propriedade de 170 hectares.
Castelo de Pedras Altas
O projeto começou a ser idealizado
em 1904, e a pedra fundamental foi colocada em 1909. A localidade,
chamada Pedras Altas, forneceu o granito rosa necessário para a
construção da fortaleza. E ela segue lá, um século depois, mesmo que em
deteriorado estado de conservação. O Castelo de Pedras Altas está
aberto para visitação, e foi com o espírito da descoberta (depois de
passar por uma muito esburacada estrada de chão) que estivemos lá no
verão de 2010.
As torres do Castelo
Nascido em São Gabriel, na região
da campanha, Joaquim Francisco de Assis Brasil tornou-se político – foi
eleito deputado provincial e nacional – e diplomata, trabalhando em
diversos países, como Portugal, Estados Unidos, México e China. Sua
moradia no interior gaúcho permanece repleta de lembranças históricas
desse período: um sabre presenteado pelo imperador chinês; um carro
enviado por Henry Ford; algumas relíquias da Revolução Farroupilha. A
figura pública do patriaca dos Assis Brasil fica registrada pelas
fotografias que apresentam a assinatura do Tratado de Paz de Pedras
Altas, em 1923, e mostram o convívio que ele teve com nomes como Santos
Dumont e o presidente americano Roosevelt.
Com infiltrações, as paredes acolhem retratos da vida do proprietário
Lydia e Joaquim nos anos 20
Ele havia de trazê-la ao Brasil, e
para viver em Pedras Altas o embaixador decidiu proporcionar à esposa o
conforto e o luxo da corte europeia, construindo seu próprio castelo.
Construção em estilo "cottage", em Pedras Altas
Para acompanhar o progresso das
obras e acomodar a família na pampa gaúcha, o proprietário mandou
assentar, ao lado do canteiro de obras do castelo, um cottage projetado
por ele mesmo. Inspirado no estilo norte-americano, o chalé é uma das
primeiras casas feitas em material pré-fabricado no Brasil, e segue em
uso até hoje.
Envolto na aura do pioneirismo e
decidido que a vida rural deveria ser ao mesmo tempo enobrecedora e
árdua, Assis Brasil afixou nas entradas da fazenda os dizeres:
“Bem-vindo à mansão que encerra / Dura lida e doce calma / O arado que
educa a terra / O livro que amanha a alma”.
Excentricidade do dono: pedreiro
comete equívoco ao escrever a palavra "dura" e Assis Brasil manda
colocar assim mesmo. Aprendizado no erro.
Para incentivar seu espírito
campestre, o diplomata foi também criador de animais de raça, trazendo
para a região os touros devon, oscavalos árabes e os ovinos ideal e
karakul. Foi pioneiro na plantação de nogueiras da espécie pecã e de
eucaliptos (muito em voga nos dias de hoje – sem efetivos resultados,
diga-se de passagem). Introduziu inovações tecnológicas na estância,
coletando a água da chuva por meio de uma cisterna elevada.
Cisterna elevada para captação da água da chuva já no início no século XX
Construiu estrebarias, galpões, e
criou uma leitaria para produzir manteigas e queijos. Estes espaços
ainda existem, mas estão na maioria desativados. Quando visitamos a
fazenda, um forte temporal havia se abatido na região e feito cair
algumas árvores centenárias, o que destruiu parte dos bretes existentes.
Para garantir conforto aos
familiares, Joaquim Francisco levou luz ao castelo através de um
pequeno gasômetro. No quarto do casal, a primeira suíte do país, os
móveis são franceses e a porta de correr ainda funciona.
A penteadeira e os objetos de dona Lydia
Para colocar a estáncia no mapa,
Assis Brasil fez passar por ali uma linha de trem. E abriu as portas do
castelo para quem estivesse interessado, tratando ele mesmo de receber
os visitantes no sua fazenda/centro cultural. Assim, o visitante, se no
início do século XX vivesse, desceria do trem na estação de Pedras
Altas, em frente à propriedade da família. Poderia ter vindo de Bagé,
para conhecer o gado Jersey, a nova raça que ali chegara, vinda da
Inglaterra. Ou de Pelotas, numa conexão desde Porto Alegre, fosse ele
representante de algum governo em apuros. Cada dignatário assinalava
sua presença em pedaços de couro que o anfitrião mantinha em sua mesa
de trabalho. Em 1923, em meio às escaramuças da revolução que
intencionava o fim do continuísmo do governo deBorges de Medeiros,
Assis Brasil, um dos líderes do processo, recebeu em Pedras Altas os
mentores do tratado que determinava o fim da revolta.
Acordo que encerrou as rivalidades armadas em 1923 foi assinado no Castelo
Homem das letras, fez a prole adquirir gostos apurados, refinados com literatura em línguas estrangeiras e sonatas ao piano. Para seu espírito culto, montou uma preciosa biblioteca, dotada de obras em edições originais, como o Antônio Ximango, de seu correligionário Ramiro Barcelos (que assina a obra sob o pseudônimo de Amaro Juvenal). Nas estantes que tem cerca de 8 mil títulos, estão também as primeiras edições do Correio Braziliense, primeiro periódico brasileiro, editado em Londres por Hipólito José da Costa. Toda a coleção mantém-se até hoje pelo capricho do proprietário, que tinha na granja um encadernador a sua disposição.
A biblioteca de Assis Brasil
As temáticas variadas de seu
conhecimento fez com que Assis Brasil fosse também escritor, com uma
bibliografia que inclui o livro “A Cultura dos Campos”, publicado
originalmente em 1898 – e que nós encontramos em um sebo em Pelotas, na
sua segunda ou terceira edição –, e o livreto de poesias conhecido como
“Chispas”. De seu escritório/sala de leitura, o inventivo estancieiro
criou mata-moscas e a bomba de chimarrão de mil furos que jamais entope
e leva o seu nome. Considerado o patrono da Agricultura do Rio Grande
do Sul, Joaquim Francisco de Assis Brasil dá nome ao parque de
exposições de Esteio.
Da família Assis Brasil, irmãos e tios de Joaquim Francisco, descendem cineastas, músicos, escritores. Luiz Antonio de Assis Brasil, anunciado novo secretário de Cultura do RS, dedicou três volumes para as atividades pampeanas da família, na saga Um Castelo no Pampa, reeditada em 2010 pela L&PM e composta pelos romances “Perversas Famílias”, “Pedra da Memória” e “Os Senhores do Século”.
Da família Assis Brasil, irmãos e tios de Joaquim Francisco, descendem cineastas, músicos, escritores. Luiz Antonio de Assis Brasil, anunciado novo secretário de Cultura do RS, dedicou três volumes para as atividades pampeanas da família, na saga Um Castelo no Pampa, reeditada em 2010 pela L&PM e composta pelos romances “Perversas Famílias”, “Pedra da Memória” e “Os Senhores do Século”.
Livro de Luiz Antonio de Assis Brasil
O Castelo de Pedras Altas foi
tombado pelo Patrimônio Historico e Artístico Estadual em 1999.
Atualmente é administrado por Lydia, neta de Assis Brasil. A ideia da
família é criar um centro cultural no local, projeto que entra em fase
de captação de recursos. O atual estado de conservação revela que há
muitas deficiências na infraestrutura, como as partes elétrica e
hidráulica, ainda em estado original. Para preservar o acervo, Lydia
Assis Brasil mora no Castelo e preside a Associação de Amigos da Granja
de Pedras Altas. Na internet, o site www.assisbrasil.org apresenta a
história do local e de seu proprietário, bem como a árvore genealógica
da família. O visitante interessado deve marcar horário com
antecedência, pelos telefones 53 3613.0099 e 53 8113.1417, a um custo a
partir de 20 reais.
Vista da varanda da Fazenda São Manoel, em Pedras Altas
Para quem quiser aproveitar a
estada no interior do Rio Grande do Sul, e enfrentar a estrada péssima
só no dia seguinte (a RS-608), a dica é contatar o estancieiro Bazileu
Azeredo, da Fazenda São Manoel. Ele oferece quartos com banheiros
privativos, além de café da manhã na estância e com possibilidade de
fornecer almoço e jantar de comidas campeiras, provavelmente um
churrasco de ovelha (valores à parte).
Um tapete de ladrilhos hidráulicos
A estância São Manoel é também uma
fundação centenária, com salas que tem ladrilhos hidráulicos
preservados e uma agradável varanda. A principal produção do local é
pecuária, e nas instalações tem salão de festas, piscina e um açude com
trapiche.
Um avarandado agradável
Para agendar uma visita e a
hospedagem, basta ligar para o Bazileu, 53 3613.0081 ou 53 8412.3402. A
estância está localizada nas marcas onde surge o povoado, e para
encontrar basta ir perguntando.
Fonte: Blog Imagina: conteúdo criativo
Colaboração: Alan Otto Redü
Colaboração: Alan Otto Redü
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